sábado, 26 de fevereiro de 2011

Corredores

Caminhava agonizantemente por todos os corredores da universidade. Procurava alguém que não a queria ver, não a queria encontrar. Pois, buscava respostas e idealizava verdades. Mergulhada em profundas carências, caminhava na esperança de alguém ouvir seu pedido de socorro. No saguão havia uma grande manifestação de intelectuais, mestres e doutores expunham suas teses, em dialetos, para seus honrosos aprendizes. Ela carregava uma mochila grande, pesada e chamativa nas costas, queria passar despercebida pelas pessoas, mas com aquela mochila seria impossível. No entanto, tentou se esconder entre as árvores do jardim para apreciar as palestras.

Enquanto pensava em todas aquelas grandes teses e imaginava algumas possibilidades para planejar seu ideal, direcionou seus passos apressados ao bar mais próximo, estava cansada e faminta. No bar proletariado encontrou estudantes politicamente incorretos discutindo sobre a apolítica brasileira. Logo, ela se enturmou com os estudantes, entre o tradicional cachorro quente e as cervejas baratas, conversavam sobre as teorias de alguns grandes filósofos e sobre os modernos comportamentos humanos. Jogaram sinuca e deram muitas e boas risadas das hipocrisias sociais que mascaravam a realidade. Ainda no bar, brigou com um mocinho de tom irônico que se achava melhor do que os outros por ali, quando não passava de um inocente e infeliz rapaz, vítima dos medíocres valores morais.

Voltou à universidade, deixara sua mochila pesada com os amigáveis estudantes que havia conhecido, precisava continuar pela constante procura de ajuda. Tinha sede de compreender melhor suas próprias idéias, precisava de livros e orientações para compor o seu pensamento e, sobretudo, precisava de uma linguagem para poder se comunicar. E mais, necessitava conhecer-se e sentir-se um pouco segura. Agora, carregando somente as dúvidas, andava sem rumo naquele lugar na espera de melhores possibilidades. Pelos cantos lia seu livro de literatura universal. Quando olhava aos arredores as pessoas fingiam que não a via, mesmos lançando-a olhares tortos. Sentia-se indiferente pelos transeuntes da instituição, porém, ainda, conquistou raros e difíceis sorrisos.

De cabeça baixa e pensativa observava os murais dos corredores e, de repente, dentre os murais, havia um de fotos. As fotos eram de flagrantes pela universidade, e para a decepção da moça que só queria passar sem ser notada, foi clicada, ridiculamente, escondida entre as árvores, espionando as palestras com sua mochila pesada.

Sua singeleza foi motivo de chacota entre professores e estudantes, a pobre apenas sorria àqueles que a debochavam e a ironizavam em piadinhas e indiretas. Ela pegou sua mochila chamativa no bar e voltou para casa da sua tia, que a acolhia com seus transtornos psicológicos e lhe aconselhava com as palavras amargas de uma vida maldita.
               
Mais tarde, a moça e a tia jantavam no silêncio da mente fervilhante. Depois de um dia cheio de cansaço e descasos, mastigavam a indignação por aqueles que se apresentaram na soberba da superioridade, engolia as atitudes, as falas e os olhares desdenhosos. Em reflexões do âmago, a pobre moça levanta-se da mesa de jantar, vai ao lavabo, enquanto lava as mãos olha-se ao espelho e tristemente diz: “A culpa é desse dente torto”.

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Considerações sobre "A Metamorfose" de Franz Kafka

O conto “A Metamorfose” descreve o convívio de uma família depois que o filho mais velho tornou-se uma barata gigante. Nesse livro, Kafka conseguiu representar o sentimento de rejeição e estorvo familiar na transformação de homem em barata.


A obrigação de alimentar um integrante, suportar a presença, a vergonha que a família sente pela aparência incomum, as mudanças de hábitos do indivíduo, o fato de o filho não mais ser uma renda, mas sim um verdadeiro estorvo dentro de casa, etc. O filho transformou-se em algo que saiu dos velhos costumes e a sua presença transformou-se em um incomodo.

Ao crescer e conhecer outras vivências sofremos nossas metamorfoses e quando não mais aceitamos as hipócritas razões tradicionais e começamos a contestar os velhos hábitos, passamos a ser um verdadeiro estorvo àqueles que nos transmitiram seus ensinamentos, pelo fato das idéias encontrar-se em contraposição. Assim, a relação familiar torna-se apenas a de cumprir as obrigações institucionais, regada a falsos e tolerantes afetos.

O metamorfoseado é um estranho no ninho, sua presença causa constrangimento, suas atitudes incomodam, seus pensamentos são considerados errôneos, com isso passam a ignorá-lo e até mesmo odiá-lo por causa de toda perturbação, principalmente a do convívio social.

A barata sente-se rejeitada e incompreendida, vive sozinha pelos cantos como se ninguém a pudesse ver e sua família prefere ignorá-la, mas sempre cumprindo os deveres de uma família constituída de cidadãos humanos.

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Entre Paradoxos

Hoje já passou o pior dos ódios em minha alma.
Hoje já tive vontade de ter um filho.
Hoje já estive romântica e amarga.
Tomei café e cerveja
Li poesias e filosofia
Meditei e xinguei
Pensei em suicídio e na revolução mais idealizada que possa existir
Tentei descobrir uma teoria acadêmica pra explicar minha teoria de vida
Minhas idéias estão fervilhantes enquanto mão e pés frios
Meu corpo treme no calor de 30 graus
Cheguei a extremos complexos
E ainda não cheguei até mim!

Quarta-feira

Meio dia de uma quarta-feira quente
O centro da cidade lotado, abafado.
Dois estranhos se cruzam;
Tocam-se,
Despem-se,
A pele cora, o calor aumenta.
Hormônios florescem,
Transam intensamente.
Por apenas um olhar... 

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

SUBVERSIVIDADE

            Quando era criança tinha um medo absurdo das drogas, porque assistia quietinha no sofá à violência que elas poderiam causar. Temia que uma pessoa drogada, em estado de alucinação absoluta, pudesse invadir minha casa e matar algum dos meus familiares por muito pouco. Entrava em pânico quando via um sujeito largado perto de alguma sarjeta ao redor da minha casa de infância e, permanecia à noite sem dormir, rezando a Deus para que meu devaneio não acontecesse realmente. Na minha criancice, isso era um dos meus mais aterrorizantes medos.
            Mas a vida é mesmo irônica, cedo ou tarde, descobrimos outras realidades longe do aconchego do lar. Atualmente, meus medos são de situações mais paradoxais, os viciados químicos são preocupações por outros motivos. Agora, meus maiores temores exalam cheiro de perfume importado, andam bem engomados e geralmente em carros oficiais. Esses sujeitos têm a capacidade de gerar violências que matam mais de 800 pessoas numa mesma cidade, apenas na época chuvosas do verão brasileiro. Matam inocentes em hospitais públicos, causam acidentes nas rodovias, matam profissionais da educação e estudantes, toda classe operaria e comerciantes livres. Matam pelas construções de usinas hidrelétricas descompromissadas com o meio ambiente... Presenteia nossas florestas aos americanos, ingleses, franceses, holandeses, pelo singelo serviço de pesquisar plantas e animais onde há pedras preciosas, e até mesmo pela política de proteção ao índio (piada de humor negro).
            Enfim, os terroristas engomados assassinam milhões de pessoas todos os dias. E nós somos obrigados por meios legais a financiar a destruição em massa do nosso povo e do nosso território. É apavorante!